quinta-feira, 27 de setembro de 2012

FIBRILAÇÃO ATRIAL


FIBRILAÇÃO ATRIAL

Autor do texto: Pedro Pinheiro - 23 de setembro de 2012 | 22:43

A fibrilação atrial (chamada de fibrilhação auricular em Portugal) é uma arritmia cardíaca muito comum, que habitualmente provoca batimentos cardíacos acelerados e irregulares.

Neste texto vamos abordar os seguintes pontos sobre a fibrilação atrial:
  • O que é o átrio.
  • O que é uma arritmia cardíaca.
  • O que é a fibrilação atrial.
  • Causas da fibrilação atrial.
  • Sintomas da fibrilação atrial.
  • Perigos da fibrilação atrial.
  • Tipos de fibrilação atrial.
  • Tratamento da fibrilação atrial.
Para ler um resumo sobre as arritmias cardíacas mais comuns, visite o link:  PALPITAÇÕES, TAQUICARDIA E ARRITMIAS CARDÍACAS.

Obs: o flutter atrial é um processo muito parecido com a fibrilação atrial. Em boa parte, as informações contidas neste texto também servem para ambas as arritmias.

Átrio do coração

Vamos fazer aqui uma breve revisão da anatomia do coração para que possamos entender melhor o que é a fibrilação atrial (FA).

O nosso coração possui 4 câmaras ou cavidades: átrio esquerdo, ventrículo esquerdo, átrio direito e ventrículo direito. O lado esquerdo do coração, composto pelo átrio e pelo ventrículo esquerdo, não tem comunicação com o lado direito do coração, composto pelo átrio e pelo ventrículo direito.

O sangue chega ao coração pela veia cava que desemboca no átrio direito (setas azuis). Quando o átrio está cheio, ele se contrai e empurra o sangue para o ventrículo direito. Quando ventrículo se enche, ele também se contrai, bombeando sangue em direção às artérias pulmonares. O sangue passa, então, pelos pulmões, recebe oxigênio e volta para o coração, chegando ao átrio esquerdo (setas vermelhas). Novamente, quando o átrio se enche, ele se contrai e empurra o sangue para o ventrículo esquerdo. O ventrículo esquerdo quando cheio, bombeia o sangue para artéria aorta, de onde será distribuído para o resto do corpo. Depois de percorrer todo o organismo, o sangue volta ao coração pela veia cava, reiniciando o ciclo.

O que é uma arritmia cardíaca?

Todo esse processo de contração cardíaca e bombeamento do sangue é finamente sincronizado, de modo a que cada evento descrito ocorra com um intervalo de apenas centésimos de segundo. A contração cardíaca é controlada por leves impulsos elétricos gerados por uma estrutura chamada nodo sinusal, localizada no ápice do átrio direito, composta por células capazes de gerar atividade elétrica. Se você quiser entender melhor como funciona a atividade elétrica cardíaca, leia: EXAME ELETROCARDIOGRAMA (ECG).

As arritmias cardíacas são distúrbios que surgem quando há um problema na geração ou na distribuição destes impulsos elétricos pelo coração, fazendo com que a contração das cavidades cardíacas percam esse sincronismo descrito há pouco.

O que é a fibrilação atrial?

Habitualmente, os impulsos elétricos cardíacos são gerados unicamente pelo nodo sinusal, estimulando a contração primeiro do átrio direito, depois do átrio esquerdo e, por último, dos ventrículos. Um único impulso elétrico demora 0,19 segundo para percorrer todo o coração.

Durante uma atividade cardíaca normal, o nodo sinusal dispara impulsos elétricos de forma ritmada, com um intervalo mínimo entre cada novo impulso. Não adianta o coração gerar dois ou mais impulsos elétricos simultâneos, pois o músculo cardíaco precisa de alguns décimos de segundo para se recuperar e poder contrair novamente.

A fibrilação atrial é um arritmia causada pelos surgimento de mais de um ponto nos átrios capaz de disparar impulsos elétricos. Quando há vários impulsos elétricos sendo disparados simultaneamente, de forma caótica, os músculos dos átrios passam a receber várias ordens de contração ao mesmo tempo, sem tempo de descanso, o que acaba por criar o que chamamos de fibrilação atrial. Nesta arritmia, o átrio passa a fazer curtas, sucessivas e ineficazes contrações. Visualmente eles parecem estar tremendo, como se estivessem levando um choque elétrico ou tendo uma convulsão. O átrio normal bate entre 60 e 100 vezes por minuto, que é a frequência cardíaca normal. Na fibrilação atrial ele chega a fazer até 600 contrações (curtas e ineficazes) por minuto.

Por sorte, esses impulsos elétricos caóticos não conseguem chegar aos ventrículos, pois eles obrigatoriamente tem que passar por uma estrutura chamada nodo átrio ventricular (nodo AV). Esta estrutura, localizada na fronteira entre os átrios e os ventrículos, é capaz de filtrar as centenas de impulsos caóticas que chegam, permitindo a passagem de apenas 100 a 170 impulsos por minuto (o que provoca uma frequência cardíaca de 100 a 170 batimento por minuto). O paciente fica com o coração acelerado, mas ao contrário do que ocorre no átrio, há um intervalo mínimo entre um impulso e outro para que os ventrículos mantenham sua capacidade de contração intacta.

Como o átrio em fibrilação não se contrai adequadamente, a passagem de sangue para o ventrículo fica prejudicada e não ocorre de forma linear. O sangue acaba criando um turbilhonamento dentro do átrio, fazendo com que parte dele fique represada, o que favorece a formação de coágulos (explicarei as consequências destes coágulos mais à frente).

Causas da fibrilação atrial

A idade é um dos fatores de risco mais importantes, sendo a fibrilação atrial uma arritmia muito comum em idosos. Em mais de 70% dos casos de FA o paciente tem mais 65 anos. Apenas 0,1% da população abaixo dos 55 anos tem fibrilação atrial.

Além da idade, outro importante fator de risco é a presença de doenças cardíacas; hipertensão arterial e doença coronariana são as duas mais importantes. O paciente hipertenso de longa data costuma ter os átrios dilatados, o que favorece a desregulação do sistema elétrico cardíaco. Já o paciente com doença coronariana pode apresentar um isquemia das células que geram e conduzem os impulsos elétricos, favorecendo o aparecimento de arritmias.

Para ler sobre hipertensão e doença coronariana:
HIPERTENSÃO ARTERIAL | Sintomas e tratamento
SINTOMAS DO INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO

Também são fatores de risco para o desenvolvimento da fibrilação atrial:

- Insuficiência cardíaca (leia: INSUFICIÊNCIA CARDÍACA | Causas e sintomas).
- Doenças das válvulas do coração.
- Hipertireoidismo (leia: HIPERTIREOIDISMO | Sintomas e tratamento).
- Consumo excessivo de álcool (leia: EFEITOS DO ÁLCOOL | Tratamento do alcoolismo).
- Apneia do sono.
- Doença pulmonar obstrutiva crônica (leia: DPOC | Enfisema pulmonar e bronquite crônica).
- Infecções agudas.
- Embolia pulmonar (leia: EMBOLIA PULMONAR | Sintomas e tratamento).
- Drogas e medicamentos.
- Consumo excessivo e cafeína.
 
Sintomas da fibrilação atrial

Se a fibrilação atrial não provocar uma aceleração importante dos batimentos cardíacos, chamada taquicardia, ela pode até passar despercebida. Na maioria dos casos, porém, a fibrilação atrial costuma vir acompanhada de frequências cardíacas ao redor de 120-130 batimentos por minutos, o que provoca sintomas, como palpitações, desconforto no peito, tonturas, cansaço e/ou falta de ar.

Um achado típico da FA é um coração acelerado, acima das 100 pulsações por minutos associado a um ritmo de batimento totalmente irregular.

Se você sente palpitações ou qualquer um dos sintomas de fibrilação atrial citados acima, coloque o dedo no próprio pulso para avaliar os seus batimentos cardíacos. O coração normal bate de modo regular, com intervalos de tempo iguais entre cada batimento. A frequência cardíaca encontra-se habitualmente entre 60 e 100 batimos por minuto.

Um coração com ritmo regular bate com o seguinte padrão:
tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.....tum.

Já um coração com fibrilação atrial tem um ritmo irregular, algo mais ou menos assim:
tum...tum....tum.tum.tum...........tum..tum....tum...tum.tum.tum.tum..........tum....tum......tum.tum...tum.

Pacientes mais idosos, com o coração já enfraquecido, podem não tolerar a taquicardia que a fibrilação atrial produz, que em alguns casos ultrapassa os 150 batimentos por minutos, apresentando queda da pressão arterial, falta ar importante e/ou intenso mal estar.  Se o paciente já tiver doença isquêmica do coração, a taquicardia pode agravar a isquemia, provocando um quadro de angina de peito ou até infarto do miocárdio.

AVC provocado por Fibrilação atrial
Êmbolo cardíaco provocando AVC
Complicações da fibrilação atrial

O grande problema da fibrilação atrial é o aumento do risco de AVC (derrame cerebral). Como o átrio não se contrai adequadamente, o sangue pode criar uma espécie de turbilhonamento dentro do mesmo, o que favorece o aparecimento de coágulos.

Se um destes coágulos formados sair do átrio esquerdo, ele será lançado diretamente para algum ponto do corpo (coágulos lançados na circulação são chamados de êmbolos).

Se este êmbolo saído do coração subir em direção ao cérebro, assim que alcançar uma artéria mais fininha, ele ficará impactado, obstruindo imediatamente a chegada de sangue por esta artéria, provocando, assim, uma isquemia em parte do cérebro (veja a ilustação ao lado).

O êmbolo pode também ir para outros pontos do corpo, podendo provocar trombose e isquemia nos olhos, rins, intestinos, coluna ou até nos dedos dos pés, caso o êmbolo seja bem pequeno e consiga viajar até as extremidades do corpo sem impactar antes.

Tipos de fibrilação atrial

A fibrilação atrial é classificada de 4 modos:  recém diagnosticada, paroxística, persistente ou permanente.

a. Fibrilação atrial recém diagnosticada: toda FA quando é detectada pela primeira vez é classificada como recém diagnosticada. Em algumas situações, baseado nos sintomas de palpitação, é possível determinar o momento exato do seu início. Porém, há casos de fibrilação atrial assintomáticos, fazendo com que muitos pacientes tenham a arritmia e não saibam. Estes casos geralmente são descobertos acidentalmente durante um exame médico de rotina.

b. Fibrilação atrial paroxística: são pacientes com episódios de FA recorrentes e de curta duração. Habitualmente o paciente apresenta pelo menos 2 episódios por semana, com duração de menos de 24 horas e resolução espontânea do quadro.

c. Fibrilação atrial persistente: são os casos de FA que não desaparecem espontaneamente e precisam ser tratados com drogas antiarrítimicas ou cardioversão elétrica para serem revertidos (explico a seguir na parte de tratamento).

d. Fibrilação atrial permanente: são os casos de FA que duram mais de um ano e não desaparecem espontaneamente nem com tratamento médico.

Diagnóstico da fibrilação atrial

O diagnóstico da fibrilação atrial é feito facilmente através do eletrocardiograma (leia: EXAME ELETROCARDIOGRAMA (ECG)). Em casos de fibrilação atrial paroxística, um exame chamado Holter pode ser necessário. Neste exame o paciente fica com um aparelho de eletrocardiograma acoplado em seu corpo por 24 a 48 horas, sendo possível detectar o surgimento de curtos períodos de FA ao londo deste intervalo de tempo.

O ecocardiograma (uma espécie de ultrassom do coração) também é capaz de detectar a fibrilação atrial. Sua grande vantagem é poder também avaliar o tamanho dos ventrículos e dos átrios. Pacientes com coração muito dilatado geralmente não respondem bem aos tratamentos que visam reverter a FA.

Tratamento da fibrilação atrial

O tratamento da fibrilação atrial pode ter 3 linhas de ação:
1- Reverter a fibrilação
2- Não reverter a fibrilação mas controlar a frequência cardíaca.
3- Impedir a formação de coágulos dentro dos átrios.

Cardioversão

A cardioversão é o termo usado para a reversão da fibrilação atrial. A cardioversão elétrica é realizada com um aparelho que provoca choques, parecido com o que é feito em alguns casos de parada cardíaca. A cardioversão elétrica só é geralmente feita em casos mais graves, quando o paciente encontra-se com hipotensão ou risco de infarto agudo do miocárdio. A cardioversão farmacológica é aquela que é obtida com uso de drogas antiarrítmicas por via venosa.

A cardioversão, seja elétrica ou farmacológica, está indicada nos casos de FA de início recente, quando o risco de haver coágulos formados no átrio esquerdo é baixo.  Todavia, se o paciente for idoso e já tiver um coração muito grande ou doente, a taxa de sucesso da cardioversão é muito baixa, não sendo indicada a sua realização. A cardioversão funciona melhor em pacientes não tão idosos e com coração ainda saudável.

O grande risco da cardioversão é a embolização de um coágulo para o cérebro no momento em que o átrio volta a se contrair normalmente. Nos casos de FA com mais de 24 horas,  o ideal é tratar o paciente com anticoagulantes por pelo menos 3 semanas antes da cardioversão, para minimizar o risco de embolização. Uma alternativa é  fazer um ecocardiograma através do esôfago para procurar por coágulos no átrio esquerdo. Se não houver coágulos visíveis, a cardioversão pode ser feita mesmo que o paciente não tenha tomado anticoagulantes por pelo menos 3 semanas.

Controle da frequência cardíaca

Em casos de fibrilação atrial de longa duração ou nos pacientes idosos, com coração já muito doente, a cardioversão não costuma ser usada, pois sua taxa de sucesso é baixa. Nestes casos, o tratamento visa apenas controlar a frequência cardíaca. Como a maioria dos sintomas da FA são por causa da taquicardia, quando mantemos o paciente com frequências abaixo de 100 batimentos por minuto, a sua fibrilação atrial torna-se assintomática.

O controle da frequência cardíaca é alcançado com medicamentos. Os mais usados são a amiodarona, propafenona, digoxina, diltiazem, verapamil ou metoprolol.

Anticoagulação

Todo paciente com fibrilação atrial deve ser medicado com drogas anticoagulantes, para impedir a formação de coágulos no átrio esquerdo. A medicação mais usada é a Varfarina (leia: VARFARINA (Marevan,Varfine, Coumadin)). O grande problema da Varfarina é o risco de hemorragias e a necessidade de fazer exames de sangue frequentemente para controlar o seu nível sanguíneo.

Recentemente forma lançadas no mercado três novas drogas que são boas alternativas à Varfarina por não precisarem de controle com exames de sangue. São elas: Dabigatrana, Apixabana e Rivaroxabana.

Nos pacientes muito idosos ou que tenham dificuldades de controlar seus próprios remédios, o uso de anticoagulantes pode ser perigoso, pois o risco de hemorragia é alto. Nestes casos, o médico pode optar por apenas prescrever drogas que inibam as plaquetas, como a aspirina.  A prevenção dos coágulos não tão eficaz, mas o risco de hemorragias é muito mais baixo.


Leia o texto original no site MD.Saúde: FIBRILAÇÃO ATRIAL http://www.mdsaude.com/2012/09/fibrilacao-atrial.html#ixzz27hWl3nj2

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